domingo, 28 de outubro de 2007

Velho Ancião

Ele guardou em silêncio
As Grandes Lições
Quatro Verdades
Quatro Perdões
No meio do verde
Barba de prata
Rasto de música
Caixa selada
Ninguém revela
As Quatro Lições
Na clareira fechada
Grandes Lições
Não são partilhadas

O aprendiz
Bate à porta
Do Velho Ancião
«Diga-me, Senhor
As Quatro Lições
Para obter a Razão»

Cofiando a barba
O Velho Sábio
Pondera a questão
«
Não há Uma Face
Para a grande Lição

Vais reconhecê-la
Porque te cabe na mão
E vais desejar
Guardá-la em silêncio
Para nunca morrer,
Confia no Velho Ancião»

Ninguém revela
As Quatro Lições
Na clareira fechada

Rasto de música
Caixa selada
Grandes Lições
Não são partilhadas

sábado, 27 de outubro de 2007

Política de massas

Nos últimos cinco minutos, a Assembleia era percorrida por um burburinho nervoso. O líder, o homem da palavra, o Pai, ia iniciar o seu discurso.
E ele dizia:
«Não ao imperialismo, não às armas de fogo, não ao aquecimento global, não ao aborto!»
E a resposta imediata: «YEAH!»
«Sim à liberdade de expressão, à informação fundamentada, à exploração espacial e à intervenção genética!»
«YEAH!»
«Não às prisões, aos bordéis, à repressão, ao terrorismo!»
Suado, o público gritava: «YEAH!»
«Toquem-se, sintam-se, pintem as ruas, subam paredes, cantem, troquem de máscaras, choquem o mundo, não durmam, não morram, irmãos!»
Atropelavam-se, beijavam-lhe os pés: «YEAH!»
«Gays e lésbicas, deficientes, pretos, muçulmanos, ensinem-me algo!» Uma veia no pescoço. «Estou farto de palavras, é agora ou nunca, SEJAM»
«YEAH!»
«Arte»
«YEAH!»
«Mundo Novo»
«YEAH!»
«NO!»
«YEAH!»
«Vocês ouvem alguma porra do que eu estou aqui a dizer?»

«YEAH!»

domingo, 21 de outubro de 2007

Palácio de gritos

Desço as escadas
Pesadas
Do palácio de gritos

Portas
Escancaradas

A beleza
Deste sítio

Sorvem-se prazeres
Durante o sono dos gritos


Acredito...

Pelas paredes
Durante gerações

Parentes
Insípidos

Perfuram ouvidos
No palácio de gritos.

Não há lei.

Todos são proscritos

No palácio de gritos...

Para sempre (por Dr. Milton)

Todas as manhãs vou a um café fanhoso tomar uma bica forte e ler o jornal. Ao soltar a primeira cachimbada do dia, olho em redor e penso. Não fui feito para a confusão.
O que seria de ti, Milton, num grande estabelecimento a observar profissionais de sucesso a deixar cair migalhas e saliva das bocas abertas? Quel horreur. Não. Dou-me ao luxo de exigir privacidade total.
Bebo o café com os punhos da camisa desapertados porque um bom café tem que ser apreciado lentamente, com todos os sentidos. Sinto o licor adocicado pela garganta e penso. Para sempre. Não posso apreciá-lo sem imaginar que é para sempre. O conteúdo insignificante desta chávena destina-se única e exclusivamente a provocar-me prazer. Eu deleito-me. Para sempre.
Seria concebível, hipoteticamente, que ele se revoltasse e gritasse «cospe, velho, cospe, os teus lábios são ásperos, és feio, não te quero para mim»? Não. Quel horreur. Não concebo tal coisa. No meu interior, eu sou merecedor do que quer que seja e deleito-me. Para sempre.

A ironia do ser humano...

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Espelho de almas

Quero abrir a tua mente colorida foragida
Quantificá-la a cada segundo
Erradicá-la cortá-la em mil pedacinhos
Faúlhas com que decoro o resto do mundo
Quero desaparecer em permanente sufoco
Na cara nos dentes nos olhos pescoço
Envolvida por ideias tão tuas é nunca é pouco
Imaginar andar cantar criar exagerar fingir-nos um fosso
Fortalecer o nosso corpo exangue
Ouvir a minha voz 2 3 4 vezes em duplicado
No quadro figuras de carne de osso de sangue
Rejubilam almas faíscas encontros inesperados

adigarof adiroloc etnem aut a rirba oreuQ
odnuges adac a al-ácifitnauQ
sohnicadep lim em al-átroc al-ácidarrE

odnum od otser o oroced euq moc sahlúaF
ocofus etnenamrep me recerapased oreuQ
oçocsep sohlo son setned son arac aN
ocuop é acnun é saut oãt saiedi rop adivlovnE
ossof mu son-rignif raregaxe rairc ratnac radna ranigamI

eugnaxe oproc osson o recelatroF
odacilpud me sezev 4 3 2 zov ahnim a rivuO
eugnas ed osso ed enrac ed sarugif ordauq oN
sodarepseni sortnocne sacsíaf samla malibujeR

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Morte e Vida

Uma
Mulher de vermelho

Corta-te
A respiração
Reveste os teus preciosos pertences
De podridão

Não se reflecte no espelho

Outra
Inexpugnável
Perfeita promessa
Sensual
Impede-te de fugir
Sendo sempre igual

Inesquecível.

Morte e Vida.
Morte e Vida.

Raio de mulheres.

Nunca estão sozinhas em lado nenhum.

domingo, 14 de outubro de 2007

Para uma amiga doente.

Sou uma mulher sem cabelo, hilariante! Pareço um pobre frango com uma gravata às riscas nestas roupas de hospital. Oh! Aí vem a minha amiga, a mais querida das minhas amigas e ela sorri ao pobre frango que aos olhos dela está revestido de penas laranja, verdes e rosa. Como te adoro e te abraço com toda a minha força, trememos com este aperto bom, ambas choramos lágrimas de gratidão e beijamo-nos, tu estás ao meu lado, eu sei. As pessoas não mudam, não mudam, e não foi a fé nem foi a força nem foi merda nenhuma que me provou isso, só a tua cara e o teu riso generoso. A ti a vida, companheira. A ti a vida.

Como queria estar no teu lugar. Sabes,atéestou.


Atéestou.

sábado, 13 de outubro de 2007

Pezinhos de veludo

No quarto de bonecas
Ouvem-se passos
Carrinho a pilhas
Pernas e braços
Caixa de música
Bolas de pano
Perucas de fitas
Prenda de anos

Para lá do conflito
Para lá do cansaço
Para lá do mito
Para lá do abraço
Há uma porta aberta
No escuro

Em noites despertas
Enfio-me na cama
Em pezinhos de veludo…

Des-culpa

Não esperes. Salva-te.
Não tentes incutir a culpa em mim.
Revolta-te.
Descobre tudo o que há em ti.

Despe-te.
Ama-te.

Mostra-te.

Chama-me quando não precisares de mim.

Des-culpa.

A culpa morreu.

Deuses em chamas

Pelo beijo
Aura de fogo
Sôfregos
Um sobre o outro
Mordemo-nos
Marcas de sangue
Perigoso

Ou mortos
Ou lobos

Renhidos
Lábios unidos
Rasgados
Enamorados

Céu descarnado

Deuses
Em chamas!

Horizonte

Árvores ruivas extasiando transeuntes levados pelo vento
Vozes vivas borbulhando atrás de paredes de cimento
Pequenos rostos dominados pelos seus próprios pensamentos
Cidades de mim, a beleza do momento!
Fervilhando e ansiando sensações em fogo lento
Todos estes corações em batimento!...

Devia partir
Para o horizonte
Sê-los TODOS
Não contes...

Ondas esverdeadas engolindo surfistas em movimento
Chador púrpura luzindo sob o sol sangrento
Palácios de pedra num flash, sorrindo de contentamento
Cidades de mim, a beleza do momento!
Fervilhando e ansiando sensações em fogo lento
Todos estes corações em batimento!...

Devia partir
Para o horizonte
Sê-los TODOS
Não contes...

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Vou pintar a minha pele
Cobrir-me com ela
Fazer dela uma tela de renome
Em traços arrojados
Escrevo o meu legado
Impregno-me, entranho-me
Poesia pincelada
Sou eu
Veredicto
Deixo-o por escrito
Num único sopro
Banho de espuma

Rabisco trejeitos
Que levo na bruma

Gotejas

Tu
Gotejas gotejas gotejas gotejas gotejas

No raio de luz que trespassa este papel
Gotejas

Na janela da sala de móveis amarelecidos
Gotejas

Nos cafés apinhados de gente que foge da chuva
Gotejas

Nas conversas paralelas, entre amigos e cigarros
Gotejas

No raspar de pneus nas estradas encardidas
Gotejas

Nos copos brilhantes e nos rostos suados
Gotejas


Nas peças nocturnas, música e risos
Gotejas


Ping
Gotejas

Na minha boca
Gotejas...

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Teatro discreto

Projectados no tecto
Segredos
Selectos
Perguntam se viste
Teatro discreto

Real?
Objecto?

Soluço
Irrequieto

Hmm!

Convite
A jogos
Secretos